A Comuna Dzerzhinsky:
Nascimento da Indústria Soviética de Câmaras de 35mm

A NKVD

Em Julho 1934, as funções de estado da polícia Soviética eram transferidas da OGPU ao Comissariado Nacional de Afazeres Internos (NKVD). A administração da Comuna Dzerzhinsky era assim também transferida para a NKVD (embora ainda com Makarenko na direção). Esta alteração é refletida na segunda versão da FED, que apareceu no início de 1935 e trouxe a nova gravação FED/Trudkommuna/NKVD-USSR/im./F.E.Dzerzhinskogo/ Khar'kov   FED, [F. E. Dzerzhinsky Comuna de Trabalho da NKVD na SSR Ucraniana, Kharkov]. A câmara também adquiriu um acabamento em crómio cetim bem mais profissional, uma sapata porta acessórios, um botão de velocidades de menor tamanho e um visor com moldura retangular. Pelo início de 1935, o cimo da moldura do visor tangenciava o cimo da caixa do telêmetro (na parte frontal do câmara), tornando-se a característica mais distintiva de todas as cópias de Leica II Soviéticas; e virtualmente o único detalhe externo que a diferenciava da Leica autêntica.

1935 foi um ano importante para a Comuna Dzerzhinsky. Como instituição combinada de educação e trabalho, esteve esta, próximo de seu auge. A comuna cresceu para 600 membros e a sua capacidade produtiva esteve em um dos valores mais elevados de sua existência. Virtualmente todas as partes utilizadas na produção da câmara eram fabricadas lá mesmo na comuna. Contudo, este crescimento também trouxe problemas econômicos e educacionais, considerando que os participantes começavam a competir excessivamente entre si. A comuna cresceu demais dificultando a sua função original como organização dedicada a reabilitação. Particularmente, a Leica era um câmara com um sistema e até agora o FED não se concretizava como tal. A procura pela FED era alta e já o fotógrafo Russo começava a clamar pelos acessórios especiais tais como grande angulares, tanques de revelação, projetores de slides e lentes adicionais. Estas exigências eventualmente resultaram numa mudança básica na comuna. O importante acontecimento de 1935 veio em Julho quando a direção de  Makarenko na Comuna Dzerzhinsky acabava repentinamente após oito anos de intenso e dedicado trabalho. A ocasião era infeliz um para Makarenko e a Comuna. Ele era então nomeado,  como Director Ajudante de Colônias de Trabalho para a NKVD em Kiev. Em Janeiro de 1937, Makarenko foi transferido para Moscovo onde ele se dedicou integralmente a escrever e palestrar até à sua morte em 1º de Abril de 1939.

A Comuna Dzerzhinsky reteve a sua forma original por cerca de outros dois anos após o afastamento de Makarenko [44]. Durante este período a comuna continuou a crescer, atingindo 750 membros com um adicional 400 operários contratados [45]. Durante algum tempo em 1937, após Makarenko ter deixado o seu posto em Kiev, o colégio e se divorciado das atividades de produção da comuna, era a fábrica agora administrada pela NKVD. A NKVD controlava atividades econômicas, geralmente sob a forma de vários trabalhos forçados, o que rendia perto de 12·% do total da produção Soviética em 1941 [46], a produção  da FED era especificamente computada nestas atividades [47]. Contudo, é improvável que trabalhos forçados tivessem sido empregadas à Comuna Dzerzhinsky. A comuna era um modelo de instituição e sob Makarenko desenvolveu uma excelente reputação, que as autoridades muito possivelmente quiseram guardar.

A mudança na administração da comuna coincidiu com um decreto da Narkompros de 4 de Março de1937, ordenando a abolição da educação e trabalho conjugado e liquidando todos os centros de ensino na União Soviética que usassem estes métodos  [48]. Enquanto o decreto não afetava directamente a Comuna Dzerzhinsky (que não estava sob a administração do Narkompros), mas indicou o novo sentido a respeito de trabalho e educação que estavam a se desenvolver naquela ocasião.

Entretanto, continuou o trabalho na FED  e a produção alcançou 12.000 unidades em 1935 e 15.000 em 1936 [49], quando foi celebrada a produção da 25.000ª unidade [50]. Os primeiros acessórios apareceram no início de 1937, inicialmente incluindo tanque de revelação, fotômetro  fotoelectrico, lupas para examinar negativos, cartuchos para filme  e temporizadores  (self-timers) mecânico e por vazão de ar. O numero cresceu para 18 itens em 1938, muitos dos quais eram cópias directas dos seus correspondentes Leitz correspondentes. Em Setembro de 1937 a edição de Sovetskoe Foto mostra uma Leica com um acessório que é o visor esportivo dobrável. O cabeçalho declara, 'Um visor análogo está atualmente sendo desenvolvido na fábrica da comuna de trabalho Dzerzhinsky.  E de fato uma FED era ilustrada no Número de Novembro de com este visor análogo FED. É em relação a estes acessórios que a fábrica recebeu algumas das críticas mais fortes por parte de Sovetskoe Foto [51]. Aparentemente, dos 18 itens anunciados, apenas quatro eram na realidade produzidos em 1938. Outras queixas incluíam, com ênfase  suficiente, qualidade baixa, altos custos e falta de manuais.

Por 1938, quatro acessórios, lentes, estavam a ser produzidas pois além do modelo 50 mm f3,5· (tipo Elmar), estavam incluídas uma 28 mm f4,5· tipo grande angular, um 50 mm f2 ,lente de grande abertura, uma 100 mm f6,3· de foco longo, e uma assim chamada lente para cópias (tipo macro), que era na realidade a mesma lente básica f3,5· de 4 elementos numa montagem de foco mais longa que permitia fotos à curta distância (20cm).

Figura 16. A) Acima: Lentes FED de 28 mm, 50 mm (f3,5· e f2) e 100 mm. O visor de ângulo recto da FED era uma cópia do seu Leitz homólogo. 

Figura 16. B) Abaixo: Sistema fotográfico FED-S completo, como apresentado em 1939.  Câmara com objetiva normal de grande abertura, tele de 100mm, grande angular de 28mm, objetiva tipo macro, fotômetro, auto-disparador de relógio com espelho convexo e visores auxiliares tipo de ângulo, tubular para 100mm e esportivo para 28 e 50mm. Estojos de couro, tampas protetoras das lentes e respectivas embalagens com passaporte de fabrica. Ausentes tripé, sargento de segurança e cabeça de esfera, (vide fotos posteriores).

 Figuras 16 C:

Encontramos aqui os dezoito itens anunciados pela fábrica FED em 1938:

Fotômetro de célula fotoelétrica de selênio,

Visor de ângulo reto,

Dispositivo para estereoscopia com janela corretora do quadro,

Jogo de objetivas acessórias com macro objetiva focalizando ate 20cm, telefoto de 100mm f6,3, grande angular de 28mm f4,5, visor tubular para tele e visor esportivo tipo quadro para grande angular e objetiva normal com compensação de paralaxe.

Sargentos de dois tipos para segurança das câmaras e tripé de mesa de dois tipos.

Gatilho de avanço rápido com disparo opcional no final do curso “FED-Sport”

Filtros, para-sol e cartucho.

 

Fotômetro de célula fotoelétrica  com  tampa protetora e estojo marca FED

em 1940 a FED lançou uma nova variante de fotometro com o corpo totalmente em baquelite

Aqui vemos a gravação “Kharkovskii Kombinat F.E.Dzherjinskovo NKVD USSR”

 “FED”.

 

Visor de ângulo com espelho para manter o telêmetro acoplado. Cópia Leitz.

Janela  corretora de enquadramento e objetiva estéreo duplo triplet 38mm f3,8 Semelhante ao análogo Stemar mas de desenho próprio com foco fixo e sem prismas separadores. O sistema utilizava as mesmas ferramentas produtivas do fotômetro FED.

 

Jogo de objetivas acessórias: Acima: Da esquerda para a direita; macro objetiva 50mm f3,5 com foco ate 20cm, telefoto de 100mm f6,3, na carreira de trás, visor tubular para tele, , à frente grande angular de 28mm f4,5,  e visor esportivo tipo quadro para grande angular e objetiva normal com compensação de paralaxe. Abaixo: Variações das objetivas normais, de 50mm, modelos f3,5 (Industar10) e f2 (FED-S).

 

 

Sargentos de dois tipos para segurança das câmaras e dois tipos de tripé de mesa.

 

Gatilho de avanço rápido com disparo opcional no final do curso “FED-Sport”

 

Jogo de objetivas (1 a 5), visores (6 e 8) e auto disparador  com  espelho  parabólico  no verso (7).

Visor de Ângulo, Auto disparador, Fotômetro, outro auto disparador com espelho, Sargento com cabeça articulada, jogo de filtros, para-sol e cartucho reutilizável. Temos aqui toda a linha de produtos anunciada em 1938 e anos seguintes.

Enquanto sob a administração da NKVD, a Comuna Dzerzhinsky fazia algo talvez exclusivo nos anais da história da câmara; esta copia de Leica com um bom nome  como FED cuja aparência já seguia as linhas da Leica, porém parte das câmaras também foi gravada com a familiar marca comercial 'Leica', e algumas lentes f3,5· levavam a gravação 'Leitz Elmar'. Qualquer que seja a motivação, esta desconhecida prática persistiu por vários anos, durante os quais um sensível  número de câmaras foi feito. Mas apesar de algumas deficiências em mão-de-obra, a característica destes câmaras era a distinta janela do visor da FED que não era disfarçada. As primeiras conhecidas 'counterfeit Leica' foram fabricadas em 1936, enquanto que as mais comuns foram produzidas  em 1938.

Figura 17. 'Counterfeit Leica' No. 8734 (1938), na realidade uma FED-S . A FED com lente f2 e com gravações Leitz é praticamente indistinguível do item autêntico.

Ao lado, detalhe da gravação e tampa original. Note-se acima do “L” de Leica o contorno da janela do visor. Este detalhe é inexistente nas Leicas autênticas.

 

Em 1937, iniciaram-se preparações para o desenvolvimento dos dois novos modelos de FED. O primeiro era a FED-B, a ser introduzida em 1938 [52]. Era idêntica ao modelo FED, excepto por uma velocidade adicional de 1/1000 e um disco independente de velocidades lentas na frente do corpo da câmara para um adicional de velocidades entre 1/20 e um segundo.  A FED-B teria sido um cópia da Leica IIIa (G), mas o projecto embrionário nunca alcançou a fase de produção. Apenas 40 exemplares foram construídos experimentalmente em 1937, após o qual elas não mais foram mencionadas na literatura.

Um segundo novo modelo, contudo, alcançou a fase de produção, e de facto foi introduzida em 1938. Esta era a FED-S ( em cirílico a letra 'C', corresponde ao nosso 'S'). As diferenças  do modelo FED corrente eram uma velocidade  adicional de 1/1000 e a lente mais rápida f2 como óptica padronizada. Inovações eram muito lentas a chegar. Aparentemente a FED-S foi produzida em menores quantidades do que o modelo standard. Este modelo também apareceu em aparência Leica, com a sua f2 FED lente gravada como 'Leitz Summar’. a montagem de foco desta 'Summar', contudo, era bastante diferente da real Summar 50 mm f2.

Algumas alterações de estilo foram realizadas nas FED's em 1938, semelhantes às alterações que haviam sido feitas nas Leicas alguns anos antes. De início , no primeiro ano a plataforma sob o botão de velocidades foi trocado por um plano sobre um contorno redondo menor e no fim do ano, o barrote na face externa da  câmara (para engate da base removível) teve também seu diâmetro aumentado.

Figura 18. Esta fotografia marca a produção do 80 000ª  FED no início de 1938. (de 'Sovetskoe Foto', Janeiro 1939.)

 

Com êxito a procura e venda de um completo manual para a FED e para a fotografia em 35 mm, a primeira edição de Kamera FED  foi publicada em 1938 e logo esgotada. Uma segunda edição seguiu em 1942 [53]. O trabalho cobria muitas formas de fotografia de 35 mm e o equipamento FED, que foi consideravelmente bem recebido pelos fotógrafos Russos. Aparentemente o autor achando alguma inspiração no Leica Manual, se não para o âmbito do texto, pelo menos pelas ilustrações. Ao se verem as secções de perspectivas e desenhos da FED em Kamera FED,  observamos serem idênticos daquelas da Leica nas primeiras edições do Leica Manual. Pelo menos eles mostram como fechar as duas câmaras em desenhos idênticos.

Outras câmaras Soviéticas também começaram a aparecer, principalmente produtos da GOMZ fábrica em Leningrado, que eram os principais fabricantes de câmaras  pre-guerra. A Turist 6x9 cm, a Fotokor 6,5x9 cm e  a grande- formato FK (13x18 cm e 18x24 cm) que apareceu na metade do inicio dos anos 1930 bem depois da Fotokor. De especial interesse é a Sport 35 mm, modelo exclusivo de reflexão, introduzida em 1936 [54]. Apesar de ter sido produzida por apenas alguns anos, esta câmara representa um importante marco no mundo fotográfico por ter sido das primeiras 35 mm mono óptica de reflexão, tendo  aparecida pela mesma época, ou talvez um pouco antes que os Kine Exacta na Alemanha. A Sport tinha um obturador focal tipo veneziana em metal, e aceitava cartuchos capazes de levar filme suficiente para 50 poses. As velocidades iam de 1/25 até 1/500 mais 'B'. A lente era uma 50 mm f3,5· Industar-10 em montagem de baioneta (apesar de não haverem outras lentes de baioneta disponíveis). O modelo de lente da FED era também uma Industar-10, embora essa designação apareça apenas na literatura. Uma vez que a Industar-10 da FED era evidentemente uma cópia de Elmar, segue que a Industar-10 da Sport era um tipo Elmar com semelhanças mecânicas das ópticas Tessar das Contax. Outras câmaras  Russas apareceram em apreciáveis quantidades antes do inicio das batalhas da Segunda Guerra Mundial incluído as câmaras de  plástico de 35 mm tais como as Líliput, Malyutka e Smena. Também nota-se que nesse momento nos Estados Unidos,os filmes Kodak 35 mm tinham em suas caixas a etiqueta 'For Retina, Contax e Leica’, e os filmes Russos de 35 mm também tinham em suas caixas da mesma forma a etiqueta 'For FED, Leica e Contax’ [55].

       

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